O livro de António Arnaut não precisa de apresentação. Nasceu no artigo 64º da Constituição, está escrito na Lei que instituiu o Serviço Nacional de Saúde (SNS), está escrito na vida e sobretudo está escrito e inscrito no coração do povo português. O que o livro nos conta é a história da medida socialmente mais avançada da Democracia Portuguesa. Da tenacidade que foi necessária para vencer receios, resistências e armadilhas que tentaram impedir a sua concretização. E da luta que tem sido preciso travar para defender e preservar o SNS dos inimigos que nunca desistiram de o subverter, privatizar ou reduzir à expressão mais simples: sistema público para os pobres, sistema privado para os ricos.
Segundo Jorge Luís Borges, há um instante que define e marca o destino de cada homem. E por vezes esse instante também define e marca o nosso destino colectivo. Assim aconteceu com o instante em que António Arnaut decidiu apresentar na Assembleia da República o projecto de Lei de Bases do SNS. Esse instante marcou o destino de António Arnaut e transformou-se na grande causa da sua vida. Mas transformou também o nosso viver colectivo e deu outro sentido e outro conteúdo à Democracia Portuguesa.
Devemos a António Arnaut, sem esquecer o saudoso Professor Mário Mendes, o maior símbolo social do 25 de Abril. Devemos-lhe a medida mais socialista até hoje tomada pelo Partido de que ele foi um dos principais fundadores. Devemos-lhe o facto de, com a criação do SNS, se ter dado corpo a um direito humano fundamental, como tal consagrado na Constituição.
Mas o SNS não é só uma bandeira dos socialistas. É uma causa de todos aqueles para quem os direitos sociais são inseparáveis dos direitos políticos. Uma causa para todos os que têm uma visão humanista e solidária da sociedade e da vida. Não foi por acaso que o Professor Manuel Antunes, que nunca foi socialista mas é um distintíssimo profissional de saúde, escreveu: “Temos um sistema nacional de saúde de cuja filosofia e princípios muito nos podemos orgulhar”.
E por isso, como alerta António Arnaut, esses princípios não podem ser pervertidos. Nem com o recurso a um sistema convencionado, nem com um sistema de seguros–saúde, nem com um sistema de co–pagamento, nem com as parcerias público/privadas ou outros tantos esquemas que não têm senão um objectivo: distorcer o modelo constitucional, abrir o caminho à privatização. Não é aceitável que, a pretexto da sustentabilidade, se procure constantemente arranjar subterfúgios para descapitalizar o SNS em favor do sector privado. Se há dinheiro para sustentar bancos falidos também tem que haver para garantir um serviço público indispensável ao povo português.
O neo-liberalismo conduziu ao endeusamento do mercado e à diabolização do Estado, mesmo quando os níveis de satisfação desceram, o desemprego aumentou e os custos dispararam. A submissão dos serviços públicos às regras da concorrência, defendidas pelos neo-liberais, priva o Estado de intervir em áreas essenciais para a satisfação das necessidades básicas da população e distorce a avaliação dos serviços. Os serviços públicos não podem ser tratados como se fossem uma qualquer mercadoria.
Por mais absurdo que pareça, a direita parte para as próximas eleições com a bandeira da ideologia que está na origem da crise mundial. O que está em causa é o consenso constitucional, aprovado por larga maioria, incluindo o PSD, sobre os direitos sociais, nomeadamente o direito à protecção da saúde. Não há no programa do PSD uma única referência ao SNS. Ora o SNS é um imperativo patriótico, democrático e humanista. O Estado não pode ser privatizado nem demitir-se da responsabilidade de garantir a universalidade do direito à saúde.
Como disse a Dr.ª Ana Jorge, a quem cumprimento pela forma como tem defendido o sistema público, “…O SNS é a diferença entre o PS e o PSD”. E é fundamentalmente isso o que está em jogo nas próximas eleições legislativas.
Trinta anos depois, o livro de António Arnaut, mais do que uma evocação, é um acto de resistência e também um alerta e um apelo. Por isso junto fraternalmente a minha voz à sua voz para dizer que a defesa do SNS é uma obrigação moral de todos os socialistas, de todos os que perfilham valores humanistas e de todos os que se reconhecem nos direitos sociais consagrados na Constituição da República.
Agradeço publicamente a António Arnaut a Lei mais justa e mais solidária da nossa democracia e, sem dúvida, aquela que melhor concretizou os ideais de justiça e igualdade do 25 de Abril.
Manuel Alegre
09.09.2009 in www.manuelalegre.com
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